terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

É chapa...

Eles eram muitos. Pelo menos dez. Tantos o quanto ainda se permite observar; de longe. Eram vivos e mostravam os dentes quando falavam. Reclamavam, basicamente. A platéia, pálida; sem vida, simplesmente olhava. O sol queimando seus olhos miúdos. Como um estouro, se espalharam por entre os carros. Bonecos de cera, tímidos, eram puro cenário por trás dos vidros. A onda revolta atingiu uma porta de alumínio, na calçada. Porta barata; podre. Um punhado deles entrou. Os que viam e apenas viam, se aproximaram uns dos outros, buscando falsa proteção. Boiada. Sofrimento coletivo é menos doloroso! Ação. Os dois ou três foram cuspidos pra fora do hotel de quinta. Mais dentes à mostra e gingas. Partículas vibrantes: volume; calor.

O cavalheiro do hotel de alumínio recebeu reforço do mecânico vizinho. Ele ganhou a rua, numa reta inconseqüente, armado de cabo de vassoura. Atingiu a barriga de um comprido, dobrando o inimigo e ganhando tempo pra se dar conta de onde estava. Arrependimento engolido, esperou, teso, quem quisesse o embate. Soco no peito, experimentou a lona quente da Rua das Laranjeiras. "Se pulou de cabeça, não tenta virar que é barrigada". Teimosia. De pé, mostrou que tinha o que faltava aos outros. O bolo vivo gargalhou, desconfiado, espalhou ameaças e se desintegrou aos poucos na maquete irregular. O guerreiro esperou, ofegante, o abraço da massa que, passado o terremoto, gritava palavras de ordem. Ele pegou o cabo de vassoura do chão como quem empunha a espada manchada de sangue e retornou, meio manco, para o interior da oficina. Não podia perder tempo: ainda faltava trocar o radiador do Toyota, e seu Ricardo era bravo...

Um comentário:

edson dos anjos disse...

Excelente, Sabugozo. Tá melhorando a liricada...